Operação Lava Jato
A Operação Lava Jato: simbolismo, suplício e, se possível, processo penal
A Operação Lava Jato domina os noticiários. Qualquer decisão do Magistrado de piso vira manchete. Frases sem relevância, ditas de modo colateral, repercutem durante dias. Para os envolvidos, ser mencionado por um dos delatores, seja qual for o contexto, gera um linchamento público maior do que ser condenado por algum crime hediondo que não envolva o clamor público.
Esse grande espetáculo gera inúmeras indagações:
Procuradores da República precisam pedir o apoio popular para atuarem? Então de que serve o princípio institucional da independência funcional (art. 127, § 1º, da Constituição Federal)? Desde quando os servidores públicos que atuam no processo, especialmente Juízes e Promotores, podem intrometer-se na discussão de projetos de lei? Por que há medo quanto à tipificação do abuso de autoridade de determinadas condutas nitidamente violadoras do Estado Democrático de Direito?
A necessidade da Operação Lava Jato não permite que as regras do jogo sejam violadas e, posteriormente, esses jogadores discordem da alteração democrática realizada pelos representantes do povo, que, se investigados criminalmente ou não, foram eleitos de modo democrático e legítimo.
Como se não bastasse essa preocupante ingerência dos atores da Operação Lava Jato na atividade legislativa, o que está ocorrendo nessa operação não é muito diferente dos suplícios. Não há apenas o interesse em processar e julgar, mas também a vontade de humilhar e destruir publicamente, atingindo corpo, alma e nome.
Aliás, parece-me que há uma modernização do suplício descrito por Foucault (2001, p. 9) no seu livro Vigiar e punir. Não basta a pena – e em muitos casos ainda não há condenação –, pois o que se busca é o sacrifício público, principalmente a lenta destruição do ser, por meio do paulatino levantamento de sigilos de “menções em delações”, normalmente nas sextas-feiras, para que seja notícia durante o final de semana. Publicizar o sofrimento processual se tornou tão proveitoso para a sociedade e para as autoridades públicas envolvidas que se tornou algo banal.
Tenta-se atribuir um simbolismo ao Direito Penal e, principalmente, à persecução criminal (inquérito policial e processo judicial), para que se faça uma prestação pública de contas sobre a aparente eficácia, eficiência e/ou efetividade das instituições, omitindo-se as alarmantes cifras negra e dourada. Ora, basta utilizar uma operação como plataforma institucional e, com essa exposição incessante, fingir que as instituições funcionam.
Em outras palavras, descumprem a Constituição em um processo penal espetacularizado para ganharem apoio público para as propostas legislativas institucionais – como as 10 medidas contra a corrupção – e, posteriormente, mudando as regras do jogo, conseguiriam atingir todos os outros processos não espetacularizados, isto é, aqueles que envolvem pessoas desinteressantes e desconhecidas, que não justificam coletivas de imprensa, palcos e holofotes. É o simbolismo atuando em prol das instituições da persecução criminal.
Sobre o simbolismo e a função simbólica, Albrecht (2010, p. 107) ressalta:
Por função ‘simbólica’ do Direito é entendida a criação de símbolos e de aparentes modelos de solução em face de problemas sociais. O nascimento do Direito Penal econômico mostra que, com estas reformas, também uma pública pressão de expectativa, em direção a um saneamento ético da comunidade econômica, foi politicamente programada.
O que se observa é que o suplício gerado pela Operação Lava Jato contribui para um simbolismo referente ao funcionamento das instituições, como se agissem de modo impessoal, e não apenas propagando a seletividade penal (criminalização secundária) que pune os mais pobres. Consequentemente, quanto mais simbolismo, mais se incentiva o fortalecimento dos suplícios. Transformou-se em um ciclo no qual o simbolismo fundamenta o suplício e vice-versa. Nesse roteiro, se sobrar tempo, talvez tenhamos o processo penal. Talvez…
REFERÊNCIAS:
ALBRECHT, Peter-Alexis. Criminologia: Uma fundamentação para o Direito Penal. Trad. Juarez Cirino dos Santos, Helena Schiessl Cardoso. Curitiba: ICPC; Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 39. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
Acordão? Pizza? Políticos e alguns delatores prometem levar a Lava Jato para uma pizzaria
O Congresso Nacional, encabeçado pelos maiores legendas, já articula na direção de um acordão para descriminalizar o caixa 2, que é sim crime eleitoral, crime de falsidade ideológica eleitoral.
Art. 350. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais:
Pena –reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa, se o documento é particular.
É fato não existirem eleitos no país sem caixa 2 como regra. Só se elege no Brasil os candidatos com as campanhas mais caras, que mais aparecem na mídia, com mais tempo de TV, isto é um fato, por isso a necessidade em se promover o compulsório barateamento das campanhas no sentido da tentativa de uma solução de continuidade no sistema instalado de corrupção impondo uma maior isonomia para as concorrências eleitorais, medida diretamente relacionada ao principio Democrático, corolário do Estado Democrático de Direito.
Em verdade, parte das doações se faz “por dentro da lei” - quando as quantias registradas na Justiça Eleitoral constituem crimes de lavagem de dinheiro sujo, porque ocultam a origem do dinheiro, outra “por fora da lei” - dinheiro gasto em campanha, mas ocultado da Justiça Eleitoral.
Estranhamente muitas das delações que conferem benefícios aos nem tão nobres, mas imprescindíveis delatores, estão trazendo "apenas" a existência da prática de caixa 2 de diversos candidatos, porém consabido que não foram apenas caixa 2 para campanhas, mas que há muito enriquecimento ilícito pessoal advindo de empresas privadas e do erário público em troca de um processo licitatório fraudulento, emendas para os estados (...) em benefício dos doadores, no estilo melhor Sérgio Cabral em prejuízo para democracia a para o erário público.
Será que os delatores já teriam sido instruídos para objetivarem a delação de apenas a prática do caixa 2 para campanhas como forma de reduzirem as suas penas sem comprometer seus aliados políticos? Um número substancial de delações peca, não sabemos ainda se propositalmente, quanto aos detalhes do destino dos montantes, quando sabemos tratarem-se de valores deveras vultosos para não se conhecer os seus precisos fins.
Em se alcançando a descriminalização no Congresso do caixa 2 ficaria bom para todo mundo, não? Está claro porém, que nem todos terão condições de comer da pizza, pois “bois de piranha” faz parte do jogo para lhe ofertar uma falaciosa verossimilhança. Esperamos não vermos membros do Judiciário nesse rodízio que já se coloca em pauta. O Ministério Público e a PF precisarão mostrarem-se incansáveis até o final do processo, tornar público sim todos malfeitos (é preciso conferir transparência às suspeitas de desvio de dinheiro público desde que não haja prejuízo a efetividade da instrução) e contar com uma sociedade discernida apta aos maiores brados retumbantes.
Consigne-se nosso alerta com ares de profundo lamento. E mais, já se articula para a morosidade do Judiciário em busca da prescrição de crimes cuja a pena é menor.
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