As Obras e Bibliografia sobre Aristóteles

As Obras

            Os escritos de Aristóteles são geralmente divididos em exotéricos e esotéricos: os primeiros, destinados ao grande público, compostos na maioria em forma de diálogo; os segundos reservados apenas aos discípulos e estudiosos do Liceu, a escola de Aristóteles.

            Dos escritos exotéricos chegaram até nós apenas alguns títulos e pequenos fragmentos. Seu primeiro escrito exotérico parece ter sido Grilo ou sobre a Retórica (onde Aristóteles defende a posição de seu mestre Platão contra Isócrates). Posteriormente tem-se: Acerca das Ideias, Acerca do Bem, Eudemos ou sobre a alma, Protréptico e Sobre a filosofia. A obra Constituição dos Atenienses é catalogada como a única das obras exotéricas que chegaram até nós por Mário da Gama Kury, tradutor e autor da apresentação da edição da Unb da Política (ARISTÓTELES, 1985).

            As obras exotéricas foram escritas principalmente no período em que esteve na Academia, redigidas em forma de diálogos, “algumas deviam ser dedicadas à discussão dos maiores problemas da filosofia platónica (Sobre o bem, Sobre as ideias, Eudemo ou Sobre a alma)” (DONINI; FERRARI, p. 191) e outras foram escritas com as ideias de Aristóteles sobre filosofia, tais como: Sobre a filosofia e Exortação à filosofia (Protréptico). Esta última foi “escrita entre 353 e 351 e dirigida a um príncipe de Chipre; pretendia expor um ideal que devia ser comum aos filósofos da Academia, o de uma vida dedicada à investigação filosófica que fosse capaz de inspirar também à ação prática e pública” (DONINI; FERRARI, p. 191). Já o diálogo Sobre a filosofia foi escrito no período em que esteve em Assos, após deixar a Academia de Platão em Atenas, “no qual combate a teoria platônica das ideias, particularmente a teoria dos números ideais, que caracterizara a última fase do platonismo” (José Américo Motta Pessanha apud ARISTÓTELES, 1983, p. X).

            As obras que chegaram até nós são suas obras esotéricas que tratam de vários temas, com problemáticas filosóficas ou das ciências da natureza, da physis (natureza), do cosmos (mundo). Fazem parte do Corpus Aristotelicum (REALE; ANTISERI, 2003, p. 189-190); DONINI; FERRARI, 2012, p. 192-194; ARISTÓTELES, 1983, p. IX-XI):

1. Organon (que compõe os tratados de lógica):

Categorias (que estudam os elementos do discurso, os termos da linguagem), De interpretatione (trata do juízo e da proposição), Analíticos primeiros (em dois livros), Analíticos segundos (em dois livros), Tópicos (em oito livros, que expõem um método de argumentação geral, aplicável tanto nas discussões praticas quanto no campo cientifico), Refutações sofísticas (que complementam os Tópicos e investigam os tipos principais de argumentos capciosos). Sobre o Organon, Huisman (2001, p. 64) tece o seguinte comentário:

ao agruparem com o nome de Organon (que significa instrumento) o conjunto dos tratados que hoje em dia dizemos “lógicos”, nada indicando tampouco que Aristóteles tivesse visto uma unidade neles; unidade esta de resto problemática, pois não se pode afirmar, por exemplo, que o tratado das Categorias, primeiro dos que constituem hoje o Organon, não esteja lá por erro, e não devesse ter sido incluído entre os escritos “metafísicos”

2. Ciências Naturais:

História dos animais (em dez livros, mas os dois últimos de autenticidade duvi­dosa), As partes dos animais (em quatro livros), O movimento dos animais, A geração dos animais (em cinco livros).

3. Psicologia:

Sobre a alma (em três livros), Parva naturalia (pequenos escritos naturais). De acordo com José Américo Motta Pessanha (apud ARISTÓTELES, 1983, p. XI) “O Tratado da Alma (De Anima) abre a série de obras referentes ao mundo vivo, sendo seguido de pequenos tratados sobre diferentes funções (a sensação, a memória, a respiração etc.)”. Posteriormente esses pequenos tratados ficaram conhecidos sob a denominação latina de Parva naturalia. “Mas da série relativa aos seres vivos a obra principal é a História dos Animais, contendo o registro de múltiplas e minuciosas observações (apud ARISTÓTELES, 1983, p. XI).

4. Filosofia natural:

Física (em oito livros, que examina conceitos gerais relativos ao mundo físico como a natureza, movimento, infinito, vazio, lugar, tempo etc.), o Céu, A geração e a corrupção (em dois livros), Meteorologia (em quatro livros, relativos aos fenômenos atmosféricos).

5. A famosa Metafísica (em quatorze livros):

“sequência de obras dedicadas a filosofia teórica ou especulativa [...] sobre a filosofia primeira, ou seja, sobre os primeiros princípios e as primeiras causas de toda a realidade. Situados após os tratados relativos ao mundo físico” (José Américo Motta Pessanha apud ARISTÓTELES, 1983, p. XI). Sobre a Metafísica, sua estrutura “deve ser atribuída ao arranjo editorial de Andronico de Rodes, que no século I a.C. produziu uma edição memorável dos escritos do Liceu” (DONINI; FERRARI, p. 192). Andrônico de Rodes dirigiu  a escola peripatética, o Liceu, no século I a. C.  Sobre a Metafísica, Huisman (2001, p. 64) tece o seguinte comentário:

[...] os editores e os primeiros comentadores irão além das indicações de Aristóteles [...] ao darem o título, no mínimo provisório, de Metafísica (ou seja, obra que deve ser lida “depois da física”) a um conjunto de especulações que haviam ficado sem título, nada indicando que Aristóteles pretendesse reuni-las sob uma denominação única.

6. Filosofia moral:

Ética a Nicômaco (em dez livros, editada por seu filho, Nicômaco), a Grande Ética e Ética a Eudemo (em oito livros, editada por seu discípulo, Eudemo de Rodes). Segundo Donini e Ferrari (2012, p. 193), a Grande ética, ou Magna moralia, é atribuída a Aristóteles pela tra­dição, mas na verdade é uma obra um pouco posterior a ele.

7. Política:

Política (em oito livros), a Constituição de Atenas. Em nota, Mário da Gama Kury (ARISTÓTELES, 1985, p. 12) ressalta que a obra Política é o resultado de aulas ou de exposições de Aristóteles anotadas por seus alunos. Sobre a obra perdida As Constituições (da qual faz parte a Constituição de Atenas), assim se refere Marcel Prélot no prefácio da obra A Política, da editora Martins Fontes, traduzida por Roberto Leal Ferreira (ARISTÓTELES, 2006, p. XV): “As Constituições ou Politéia formavam uma vasta e metódica compilação, estabelecida por volta de 325, que compreendia a análise, em ordem alfabética, de cento e cinquenta e oito Constituições dos Estados simples ou das confederações, uma monografia sobre as leis dos bárbaros (Cartago e Roma) e um estudo especial sobre as pretensões territoriais dos Estados. A obra, insubstituível, infelizmente se perdeu, mas um fragmento considerável que se refere à Constituição de Atenas foi reencontrado e publicado pela primeira vez em janeiro de 1891 por Sir Frederico Kenyon”. Donini e Ferrari (2012, p. 193) por sua vez, ressaltam que a “Constituição de Atenas, [foi] recuperada em finais do século XIX num papiro egípcio e única sobrevivente de uma enorme recolha de cento e cinquenta e oito constitui­ções de cidades gregas que Aristóteles tinha organiza­do juntamente com a sua escola”.

8. Arte:

Poética (da qual restou apenas fragmentos), Retórica (em três livros, que se vincula a arte da argumentação ou dialética exposta nos Tópicos).

            “Além desses trabalhos considerados autênticos, o Corpus abrange ainda alguns escritos que a crítica revelou serem apócrifos, como o Sobre o Mundo (De Mundo), os Problemas, o Econômico e o Sobre Melisso, Xenofanes e Górgias” (José Américo Motta Pessanha apud ARISTÓTELES, 1983, p. XI).

            A partir das pesquisas histórico-filológicas de Werner Jaeger, Sousa (apud ARISTÓTELES, 2003, p. 22-23 e 26) destaca a seguinte cronologia dos escritos aristotélicos, divididos em: 1) o período que Aristóteles passou na Academia de Platão, chamado de período ateniense ou acadêmico (p. 22); 2) o período que Aristóteles deixa Atenas e a Academia e passa por cidades como Asso, Lesbo e Macedônia (p. 22-23); 3) o período em que Aristóteles volta para Atenas e funda sua escola, o Liceu, chamado de período do Liceu ou da organização da pesquisa científica (p. 23).

1. Diálogos (perdidos), salvo o De philosophia e o Protrepticum (exotéricos); formação da doutrina contida nos tratados lógicos e na Retórica; princípios fundamentais da Física, consignados nos livros I, II e VII (ideia de finalidade, matéria e forma, potência e acto); De caelo I; as partes mais antigas da Política (livro II cc. 2 e 3) e o livro III do De anima.

2. Os livros mais antigos da Metafisica (I, V, XI e XII, exceptuado o c. 8, cc. 9 e 10 do XIII e todo o XIV); De philosophia ("exotérico"), contemporâneo do livro I da Metafísica; Eth. eud.; livros II, III, VII e VIII da Política; De caelo (excepto o livro I) e De gen. et corrupt.

3. Em geral, todas as obras de carácter histórico e biológico; Meteor.; De anim. I e II; Parva naturalia. Nestes anos de actividade magistral, à frente dos filósofos, historiadores e naturalistas do Liceu, Aristóteles estabelece as bases de uma grandiosa suma, que vemos realizar-se nos anos sucessivos, pelo menos no que concerne à História da Ciência (Teofrasto: História da Física; Eudemo: História da Matemática; Ménon: História da Medicina). É também, neste período, que Jager situa a revisão da teoria do primeiro motor, que consta do c. 8 do livro XII da Metafisica, e, de acordo com as novas tendências empíricas da escola, os livros IV, V e VI da Política (cuja redacção se basearia nos materiais das Constituições); e, por conseguinte, também a Ética nicomaqueia, que, como "fenomenologia da vida moral'', corresponderia à "fenomenologia da vida política", desenvolvida naqueles três livros da Política; finalmente, os livros VII, VIII e IX da Metafisica com o VI, que lhes serve de introdução (doutrina da substância).

Arte Poética: último período de vida do filósofo (sobre a Arte Poética, ver p. 26).

 

Referências Bibliográficas

ARISTÓTELES. Política. Trad. por Mário da Gama Kury. Brasília: UnB, 1985.

____. Política. Trad. de Torrieri Guimarães. São Paulo: Editora Martin Claret, 2001.

____. Poética. Tradução, prefácio, introdução, comentário e apêndices de Eudoro de Sousa. 7. ed. Lisboa: Imprensa Nacional / Casa da Moeda, 2003. (Clássicos de Filosofia).

____. Tópicos; Dos argumentos sofísticos. seleção de textos de José Américo Motta Pessanha ; tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W.A. Pickard. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983. Vol. 1

DONINI, Pierluigi; FERRARI, Franco. O exercício da razão no mundo clássico: perfil de filosofia antiga. São Paulo: Annablume Clássica, 2012. (Coleção Archai: as origens do pensamento ocidental)

HUISMAN, D. Dicionário dos Filósofos. [Trad. Cláudio Berliner et al.]. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 61-71.

REALE, G.; ANTISERI, D. História da Filosofia. Filosofia pagã antiga, v. 1. São Paulo: Paulus, 2003.

 

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