Direitos Fundamentais
por Alexsandro M. Medeiros
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postado em 2014
atualizado em nov. 2016
Os direitos e as garantias fundamentais são aqueles declarados no art. 5º da nossa atual Constituição Federal, que é composto por 78 incisos e quatro parágrafos (BRASIL, 2015). Sua importância é tamanha que não é possível haver Emenda Constitucional a não ser que a modificação seja para ampliar mas nunca que vise abolir algum direito ou garantia fundamental. Por isso se diz que os direitos fundamentais compõem o grupo constitucional das “cláusulas pétreas” (tal como definidos pela Constituição no art. 60, § 4º).
As cláusulas pétreas correspondem a matéria constitucional não sujeitas a Emenda Constitucional. Além dos direitos e garantias fundamentais não podem sofrer modificação os artigos que definem a República como uma forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico e a separação dos Poderes (art. 60).
A noção de direitos fundamentais relaciona-se com a ideia de democracia ocidental, na medida em que os governantes são escolhidos pelo povo, que exercem um poder sobre a nação, mas não de maneira absoluta, sofrendo diversas limitações, devendo respeito aos direitos e garantias individuais e coletivas positivadas constitucionalmente. Garantias essas que devem ser observadas tanto pelo Estado quanto pela população (MORAES, 2015, p. 28 apud VAROLO; AGUIRRE, 2016, p. 2).
Direito à vida
Constitui o direito a permanecer com vida e ter uma vida digna. No primeiro caso diz respeito à vida biológica e por isso no Brasil é proibida a pena de morte. O segundo caso diz respeito a dignidade da existência humana, considerada um princípio constitucional e que, segundo a carta magna, em seu art. 3º, pode ser entendido como a promoção do bem estar; a redução das desigualdades sociais e a erradicação da pobreza e da marginalidade, entre outros. Veja o que diz o art:
Existem várias questões jurídicas que abordam o tema relacionado a vida, como é o caso da possibilidade de realizar pesquisas com células-tronco, a eutanásia e a questão dos fetos que se desenvolvem com anencefalia (sem cérebro). Sobre a pesquisa com embriões considerados viáveis, ver a Lei 11.105, de março de 2005 (conhecida como a Lei de Biossegurança) que estabelece as condições para a realização de tais pesquisas.
Já no que diz respeito à pena de morte a Constituição Federal é clara: “não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX” (art. 5º, XLVII).
Direito à igualdade
O direito à igualdade e com ele o direito à liberdade, como já dissemos, surge na modernidade com a queda das monarquias absolutistas. Foi o direito à igualdade que procurou acabar com os privilégios da nobreza e do clero diante da lei. Na nossa Constituição esse direito é afirmado no “caput” do art. 5º
Art.5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade [...]
Direito à liberdade
A Constituição Federal garante o direito aos diferentes tipos de liberdade. Veja o que diz o art. 5º em seus respectivos incisos
A liberdade de expressão é um direito expressamente previsto na Constituição Federal e abrange, em sentido amplo, as liberdades de pensamento, comunicação, imprensa e religião. Historicamente, tais liberdades de alguma forma já se faziam presentes constitucionalmente desde a Carta Imperial de 1824, estando igualmente presentes nas constituições de 1891, 1934 e, naturalmente, a de 1988 (apud SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2016, p. 264).
todos podem comunicar os seus pensamentos, por palavras, escritos, e publica-los pela Imprensa, sem dependência de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que cometerem no exercício deste Direito, nos casos, e pela forma, que a Lei determinar(Constituição de 1824, art. 179 IV)”.
em qualquer assunto é livre a manifestação do pensamento pela imprensa ou pela tribuna, sem dependência de censura, respondendo cada um pelos abusos que cometer nos casos e pela forma que a lei determinar. Não é permitido o anonimato (Constituição de 1891, art. 72, §12)
Em qualquer assunto é livre a manifestação do pensamento, sem dependência de censura, salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um pelos abusos que cometer, nos casos e pela forma que a lei determinar. Não é permitido o anonimato. É assegurado o direito de resposta. A publicação de livros e periódicos independe de licença do Poder Público. Não será́, porém, tolerada propaganda de guerra ou de processos violentos para subverter a ordem política ou social (Constituição de 1934, art. 113, 9).
Constitucionalmente são garantido a todos, homens e mulheres, a possibilidade de expressar seus pensamentos e ideias, expondo-os à terceiros, mas com a ressalva de que devem ser respeitados alguns limites sob pena de sanção caso essa liberdade produza danos morais à pessoa de outrem ou a sua imagem, não respeitando a sua privacidade, intimidade ou dignidade.
Malgrado a livre expressão do pensamento seja um requisito fundamental para o desenvolvimento do ser humano, esse direito não é absoluto. O seu gozo não pode ultrapassar os direitos da personalidade (intimidade, honra e vida privada) de outras pessoas, por serem esses direitos igualmente importantes na tutela da dignidade da pessoa humana (VAROLO; AGUIRRE, 2016, p. 18).
Há importantes limitações e restrições ao uso da liberdade de expressão previstas no próprio texto constitucional que não exime os indivíduos de responsabilidade por eventuais excessos que prejudiquem a terceiros e Varolo e Aguirre (2016) destacam como o direito à liberdade de expressão também aparece disposto no art. 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos
Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras (ONU, Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948, art. XIX).
Hoje em dia com o advento das novas Tecnologias de Informação e Comunicação, Varolo e Aguirre (2016, p. 2) chamam a atenção para o fato de como as relações humanas que se desenrolam através da rede mundial de computadores principalmente através das redes sociais obrigam a uma análise cuidadosa por parte de profissionais da área do direito cujos fatos ensejam “um aprofundamento jurídico sobre determinadas questões, dentre elas, a limitação de determinados direitos fundamentais, e no presente caso, mais especificamente a liberdade de expressão”. Os autores se referem ao fato específico de como hoje o discurso de ódio é um fato recorrente através das redes sociais e é analisado sob a ótica dos direitos fundamentais, da liberdade de expressão e o princípio da dignidade da pessoa humana.
No que tange ao uso das novas Tecnologias de Informação e Comunicação temos o Marco Civil da Internet (Lei 12.965, de 23 de abril de 2014) que regulamenta o uso da rede mundial de computadores e tem como fundamento e princípio o respeito à liberdade de expressão (art. 2º e 3º) mas é claro que também se aplica a este caso limitações e restrições ao uso da liberdade de expressão por eventuais excessos que prejudiquem a terceiros. Uma legislação específica sobre o tema se fazia necessário pois
Através da rede, o homem comete ilícitos, propaga mensagens de conteúdo prejudicial, viola direitos fundamentais dos demais usuários. Essa problematização, que não é essencialmente nova, porém mais complexa e potencializada por uma roupagem tecnológica, exige atitudes adequadas por parte dos entes encarregados da proteção do ser humano em sua dignidade, entre esses, o Estado (SILVA et. al., 2011, p. 446).
Silva et. al., (2011, p. 459) dão um exemplo de como as redes sociais podem ser utilizadas de forma preconceituosa e pouco respeitosa no que diz respeito à dignidade da pessoa humana, citando um caso de um réu acusado de crime de racismo através do ORKUT, onde manifestou sua opinião de forma contrária a política de cotas da seguinte forma:
Infelizmente em universidade pública não dá camarada, pra branco passar precisa tirar 200, e pros macacos passar é só tirar - [menos] 200 [...] esses pretos vão é estragar a universidade pública mais do que já estragam...não sabem nem escrever [...].
Direito à segurança
O direito à segurança é tratado em vários incisos do art. 5º como o direito a inviolabilidade da casa do indivíduo (inciso XI), o direito à intimidade (inciso X) e o direito ao sigilo de correspondências e comunicações (inciso XII).
Direito à propriedade
O direito à propriedade é previsto a partir do inciso XXII do art. 5º e hoje o ordenamento jurídico prevê aquilo que é chamado de função social da propriedade, quer dizer, o direito a propriedade é legítimo se atender a sua função social, no sentido de que a propriedade deve servir à moradia no caso de imóveis urbanos ou ser produtivo, no caso de propriedade rural. A Constituição prevê a criação de uma série de instrumentos de política e Desenvolvimento Urbano inclusive com a possibilidade de desapropriação no caso de uma propriedade não atender a sua função social. Essa política de desenvolvimento foi normatizada com a criação do Estatuto da Cidade (que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição) e com a elaboração de uma Política Nacional de Desenvolvimento Urbano.
- XXII - é garantido o direito de propriedade;
- XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
- XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;
- XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;
- XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;
Referências Bibliográficas
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 48. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2015.
FACHIN, Zulmar. Curso de direito constitucional. 7. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2015.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 31. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2015.
SARLET, Ingo; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Saraiva, 2016.
SILVA, R. Leal da; NICHEL, Andressa; MARTINS, A. C. Lehmann; BORCHARDT, Carlise Kolbe. Discursos de ódio em redes sociais: jurisprudência brasileira. Revista Direito GV, São Paulo, vol. 7, n. 2, p. 445-468, 2011. Acesso em 18/11/2016.
VAROLO, Pedro Henrique Koval; AGUIRRE, Lissandra Espinosa de Mello. A liberdade de expressão e o discurso de ódio na internet. Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, p. 1-20, out-dez, 2016. Acesso em 18/11/2016.
Direitos Sociais
Dentre os inúmeros direitos e garantias fundamentais previstos pela nossa Constituição destacam-se os direitos sociais, previstos no Capítulo II da carta magna (art. 6º): são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015).
Direitos Fundamentais e Direitos Humanos
É preciso considerar que existe uma relação muito próxima entre os direitos constitucionais e os Direitos Humanos, seja a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 ou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Essa relação é prevista no § 2º do art. 5º: “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”
E como não pensar no fato de que historicamente a ideia de direitos fundamentais não esteja relacionada com a revolução francesa e pensar no direito à igualdade e liberdade como sendo uma conquista da modernidade? Liberdade e igualdade são direitos que estão presentes desde a origem do Estado de Direito.
Hoje é comum se falar em várias gerações ou dimensões dos direitos. Fachin (2015) prefere o termo “dimensão”. São elas:
- 1a geração: Direitos Individuais (que pressupõe a igualdade formal perante a lei além de considerar o sujeito de forma abstrata);
- 2a geração: Direitos Coletivos (os direitos sociais passa a ser analisado em situações concretas, no contexto social);
- 3a geração: Direitos dos Povos ou os Direitos de Solidariedade (basicamente compreende os direitos do consumidor e os relacionados às questões ecológicas);
- 4a geração: Direitos de Manipulação Genética (relacionados à biotecnologia e bioengenharia).