Considerações Finais

12/10/2017 21:12

            Por tudo o que estudamos até aqui podemos agora compreender por que a filosofia platônica se faz pedagogia. “Pedagogia”, etimologicamente, é o caminho que indicamos às crianças, a estrada que lhes mostramos, tomando-as pela mão para conduzi-las da ignorância ao conhecimento. A filosofia é pedagógica. O filósofo propõe uma sequência de estudos, um cursus studiorum, para permitir a esses homens-crianças tornarem-se homens adultos. Como vimos, Platão nos explica que, na cidade ideal que ele imagina, desde a mais tenra infância as crianças serão submetidas a certo número de provas que permitam distinguir as que têm uma firmeza especial e uma particular resistência ao sofrimento físico. A partir daí será feita uma primeira seleção. Depois esses adolescentes, que terão sido educados com dureza, aprenderão o ofício das armas. Também serão desenvolvidas as suas faculdades de resistência, a sua coragem, a sua perseverança. Os que tiverem bons resultados nessas novas provas serão admitidos no “curso intelectual”. Isso vai até os 15, 16, 17 anos. O curso intelectual dura pelo menos uns 15 anos. Durante esses estudos, os rapazes aprenderão aritmética, geometria plana, geometria espacial – chamada então “estereometria” –, harmônica – ciência dos números em harmonia uns com os outros, o que hoje chamamos “música” –, astronomia etc. E no fim desse treinamento, diz Platão, lá pelos 30 ou 35 anos, os mais competentes, os mais dedicados terão enfim a esperança de poder contemplar o mundo das Ideias.

            Este processo é também retratado na alegoria da caverna: o homem, através da educação, se liberta das amarras da ignorância, sempre conquistando novos saberes, de grau em grau, de estágio em estágio, vencendo obstáculos, superando a fronteira entre o conhecimento e a ignorância.

            A Alegoria da Caverna é apresentada como uma metáfora da educação (veja também: Interpretação pedagógica de A Alegoria da Caverna) e pode também servir como um modelo do papel do mentor educacional, tal como Sócrates. Deste modo, podemos comparar Sócrates ao livre e sábio filósofo que entra novamente no mundo inferior da caverna escura – o mundo das coisas  diárias em que as pessoas vivem e se movimentam e existem – a fim de tentar resgatar os que vivem neste mundo escuro, embora enfrentando o perigo de ter sua vida ameaçada pela reação violenta dos “prisioneiros” dentro da caverna que encontram seu mundo perturbado por um libertador socrático. A arena para a contenda pedagógica entre a livre investigação  filosófica e a demagogia sofística ocorre no mundo escuro da  caverna – um mundo de sombras e de opinião pública, um  mundo de “lucro e perda” e de intriga política e social. O mito pode retratar ainda a batalha que ocorre no diálogo entre a tirania e a filosofia, entre a força violenta e a persuasão racional entre a educação como apresentada pelos sofistas que visam o sucesso e o domínio sobre seus estudantes, e pelos filósofos socráticos que procuram nutrir seus estudantes através de uma busca filosófica libertadora da sabedoria.

            Por fim temos a educação do rei-filósofo: aquele que é guardião e governa a cidade não tem, como ideal de felicidade, chegar ao poder para ser honrado por sua sabedoria ou para adquirir prestígio e riqueza; ele não cultiva qualquer tipo de orgulho e é feliz por ser o educador maior de todos, aquele que governa para fazer de seus concidadãos homens e mulheres melhores.

 

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